um pouco mais do que quero ser :)

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

E diante dos aplausos me retirei, como se não houvesse nenhum ser humano capaz de admirar todas aquelas encenações que tinha planejado e ensaiado há um bom tempo.
Abaixei minha cabeça, cruzei as pontas dos meus pés e abandonei o palco, como se nunca estivesse pisado ali. - Era sacrifício apagar os minutos em que estréiei aqueles movimentos complexos e curvados que só imaginava e não moldava ao meu corpo.
A luz refletida, olhos brilhando em minha direção e um chão alto de madeira só pra mim. Poderia rodopiar à vontade, era arte, e arte é o encontro do externo com a alma.
Eles esperavam surpresas, esperavam que eu me contorcesse até a minha coluna se encontrar com as entradas do meu tornozelo, e sem dor abrir um sorriso, mostrando o quanto era fáçil ser flexivél e atriz.
Só que muitos não sabiam, que não vinha do coração, era obrigação, teatro. Era o espetáculo da vez, o da roupa colorida e brilhante ; que iria guardar e relembrar todas ás vezes que me sentasse em frente ao espelho e pintasse as minhas pálpebras de laranja, talvez seria a peça chave, porque ultimamente minha face era de um tom nude, apagado, normal, e só um nariz de palhaço para alegrar o que chamava de depressão.
Por longos dias me encontrei vestida com aquela fantasia que eu mesma havia criado, e lembro até hoje como a fiz. Numa tarde de inverno , catei todos os retalhos que havia sobrado de " Sonho de uma noite de verão ", " Minhas lágrimas secam sozinhas ", " O lago dos cisnes " , e outras cenas perdidas dentro do closet. [...]
Liguei a máquina de costurar e fui emendando os tecidos até formar um corselete que prendia dos meus seios até o meu quadril. Completei com babados de filó para dar um ar de bailarina moderna e rasguei a meia-calça preta que usaria no halloween ; pra completar calçei as minhas sapatilhas douradas e prendi o coque com uma redinha.
A visão que tinha era de uma boneca de pano, esquecida num canto do quarto. Trazia muitas estórias com suas cores, mais quando a melodia fina se chocava com sua dança, tudo se transformava.
As lágrimas escorriam, molhando qualquer concepção de que preto é luto. - Pode até ser, mais arco-íris não significa nada. E assim as palmas vingaram .. Mais meu deus! Pensei : Eles não entedem.
Nanda Oliveira
Não sei porque eles reclamam tanto da chuva. - Acho que ainda não conhecem o poder que ela tem ; alegrar os corações vazios, chorar com os que estão tristes, molhar lavouras, juntar casais sobre camas e filmes , devolver inspiração para os escritores, derramar sobre a cabeça dos homens a limpeza que eles tanto almejam. Não sei, mais a chuva é mágica, é sagrada. Nanda Oliveira
Não se justifique. - Engula a seco todas as tentativas fracassadas, todos os enganos, decepções. Adianta sofrer? Chorar? Não venha com essa de dizer que existem amigos verdadeiros. Até hoje não conheci nenhum, me simpatizei com uns e outros, que me roubaram sorrisos, ignoraram algumas lágrimas, me informaram sobre o episódio que não assistir, e eu burra depositei minha melhor gratidão e cuidado. Mais sabe de uma? Eu sou completa comigo mesma, eu ando por aí, converso com o espelho, e bebo as últimas garrafas de cerveja que sobrou na geladeira. É incrível, mais eu me tenho, isso basta. Nanda Oliveira
Eu sentia pena de Z. É, pena. Como ela havia me dito ; pena acabava, destroçava, rasgava Z. Pena era o tudo. - Passei tardes, e noites com aquele moço engraçado, que tinha um sorriso largo, e palavras contraditórias. Me sentia bem ali, confortada com tanto mistério. Eu sempre gostei de mistério, mais todo problema era aquela curiosidade que Z não dissolvia. Eu sabia que ele precisava de mim, que querendo ou não, ele dependia da minha presença, e principalmente da dela.
Ela incentivava, guiava, acalentava Z . E ele burro, não entendia a importância que ela tinha, o significado que a vida dele tomou depois que ela apareceu.
Mais os dias se passaram, e todo encanto se perdeu em meio a tanto desgosto, a pequenas angústias e comédias que se acumularam. Foi acabando como algumas histórias que começam com : Era uma vez ..
E sabe o que é pior ? Z está sozinho, sempre esteve. Não tem mais as minhas palavras ingênuas e mudas. Nem as certezas dela, ele está oco, vazio, perdido. Perdido mesmo, sem mais nenhum ombro, bochecha, e ouvidos.
Z está só, e só é ruim. É como se todas as cadeiras estivessem sendo ocupadas, mais do lado dele não estivesse ninguém. É triste, irrevogável, penoso como sinto.
- E para surpresa de todos, aqui dentro ainda resta alguns cumprimentos, bate-papos, e audição. Z não sabe, mais eu compreendo. Nanda Oliveira
Acordei com minha mãe fazendo barulho. Na verdade ela queria mesmo que eu acordasse, despertasse pra vida e acompanhasse ela com o programa de domingo. - Puxou o lençol que cobria metade do meu corpo, e sorriu. Ela achava graça da minha cara de maluca, dos meus olhos grudando com restos de delineador da noite anterior, e os meus seios expostos.
Ela não sabia, mais eu passei a noite toda escutando Love Story, e chorando a cada troca de música que meu celular insistia mudar. Estava mal, não como se fosse tirado a minh'alma, ou se praticamente estivesse recebido uma noticia ruim, mais todos os pontinhos que havia juntado durante esses noventa dias tinha escapulido. E minha janela estava trancada, o sol? Nublado. Mais uma vez. Nanda Oliveira
Pelas gretas da janela vi alguns rabiscos de girassóis. – Eles são amarelos e brilham. Sim, eles brilham, e giram de acordo com o movimento dos ventos contrários.
Achava que girassóis iam de acordo com os sóis dos dias, com o sol de hoje, o que ainda há de vir, e o que nasceu ontem. Mais não, é involuntário vê-lo rodar, espalhar pequenas e finas pétalas pelo chão obscuro e deserto, pelo chão.
Sempre analisei as flores. Cada uma com sua cor, trigonometria, vestígio. E o melhor: perfume. O que espalha, acalma, ressuscita.
Mais os da minha janela são diferentes. – Juro que são racionais, eu escuto as suas vozes, as súplicas que exalam quando a luz profunda invade os poros das suas sementes e faz florescer. Acredito que os girassóis da minha janela são mágicos. Nanda Oliveira
- Silêncio.
Tem que se calar, pra conseguir descobrir o que se passa nos pensamentos alheios, nos abrigos calados, nas memórias esquecidas. Menos conversa, menos zoada, menos falatório, menos perguntas, menos questionamentos, menos exposição. Só menos, nada de mais ; e eu querendo gritar. O mal talvez seja esse. Se esconder por tanto tempo atrás de uma cortina, e quando decidir sair, uma manta vermelha cair bem sobre a sua cabeça. - E vermelho não é bom.
Vermelho envergonha, distorce, frustra. Vermelho seca, e corrompe; vermelho brocha, acaba. E suas palavras vermelhas me empurra de volta pras cortinas. Nanda Oliveira
A minha porta era larga, alta, arreganhada. Estava sempre à disposição da minha própria saída. Eu escutava de tudo, até as piores coisas que me influenciava a desistir daquela casa.
Casa bonita viu? Arejada, saudável, tranquila por sinal. Na verdade quando adentrei aquele lugar, estava com um pouco de medo, talvez de me acostumar com tanta hospitalidade, cuidados, que seria praticamente impossível abandonar o lugar.
Mais entrei, de ponta de pé, calada, observando todos os móveis, todos os metros, tudinho. E me deparei com um dos lugares que eu mais almejo em um lar: O quarto. O único quarto dos aposentos. - Era claro, úmido, enorme. O coração da casinha bonita. Mais faltava algo, sabe quando você compra uma camisa? E essa camisa é grande, meio folgadinha, de um tom bege, mais precisa de um complemento, um acessório pra dar o ar da graça ? Era assim. Como a vestimenta, o quarto faltava algo. E o pior, considerava como o órgão que movimentava todo o resto, então sendo assim não poderia ter falhas.
Ignorei qualquer detalhe que pudesse acabar com a minha mordomia, e assim organizando da minha forma. O vento soprava, abria as janelas, e eu pus uma persiana. A cama ficou por anos encostada naquele canto, e eu a troquei de lugar. Os armários eram antigos, de madeira. Pintei cada um manualmente e com cores. Só que uma coisa ainda me incomodava. - A pingueira do teto.
Quando não chovia estava tudo bem, mais era aparecer a primeira tempestade que o meu quarto insistia inundar ; e eu com minha falta de paciência relutava contra o vazamento, e quanto mais pingava, eu pensava em desistir.
Até hoje isso acontece, e não abdiquei, não abri mão da minha casa. Estou com ela, e pode vir uma onda de tsunami cobrir o meu teto, e mesmo assim estarei suportando a pingueira. Nanda Oliveira
Yes, digo sempre: Uma vontade de você.
Desde aquela quarta eu não me sentia mais completa, realizada, como costumava afirmar. Ela tinha tirado todas as minhas forças e levado com aquela camisa vermelha que vestia.
Encostada naquele ponto de ônibus, eu via os carros passarem, uns mais rápidos e outros mais lentos. Havia acabado de comer algumas bobagens, e toda minha inquietação se entretia na tela do meu celular, que avisava ser 22:20, pra um encontro às dez.. e vinte minutos era muito para minha ansiedade. Suspirava e bagunçava a frente do meu cabelo, nada daquela mulher chegar. - Pensei em desistir das insanas palavras que rodeava a minha mente, acenando que eu estava certa e pronto. Mais ao mesmo tempo imaginei que poderia chegar e me abraçar e não precisássemos dizer nada. Só encostar os nossos rostos na virada dos pescoços, e respirar, de um jeito ofegante e forte. Forte como a minha vontade. Nanda Oliveira